sábado, 26 de dezembro de 2015


Lamento por quem nunca perdeu. Nunca chorou. Nunca sofreu. Nunca se rasurou. Quem ainda não se atrapalhou no caminho e desviou de seus objetivos, fazendo coisas que não imaginava e sentiu-se estranho em sua própria pele.

Espanto-me com quem, nunca chorou de saudade, nunca sentiu ciúmes, não cometeu insanidade, não se atrapalhou com os sentimentos, não sentiu tristeza e não conhece solidão.

Não compreendo as pessoas que nunca tropeçaram nas tentativas, não cometeram tolices com os sonhos impossíveis. Acho estranho que não confia no acaso e não dá ouvidos à sorte, não sorri de seus equívocos, não tem ciúmes e nem tonturas por amor. É bastante esquisito quem não tem coragem para virar a mesa, afugentar a maldade, permitir a ternura e tomar um porre de emoções.

Lamento quem não se deixa amar. Não enxerga o essencial e perde-se com as futilidades. É triste quem não se esforça para esquecer as perdas se interessando por outro amor.



Não concordo com quem não recria de última hora, não sabe nada além do trivial, não revela suas emoções, não respeita as lembranças e não chora por elas.

Quem não transgride para salvar um amor, não tem tempo para a saudade, não resolve suas emergências e não dá uma segunda chance a vida, definitivamente não merece as generosidades da vida.

Nisso tudo não sobra quase nada. Não é uma sentença, mas sinto muito por quem nunca chorou de saudade. Não ficou vermelho de emoção. Perdeu o romantismo e esqueceu-se dos desatinos feitos por amor.

Entristeço-me com quem consegue enclausurar a vida, boicotando a oportunidade de colocar o rosto além da janela e com ar tristonho aproveita apenas meia fatia da belíssima paisagem lá fora. Consegue viver encarando apenas a metade de sua existência e privando-se da real felicidade das coisas pequenas.

Por implicância exige nada de si mesmo e recebe migalhas. Não desafia seus limites e principalmente não descobre a diferença entre a ficção e a realidade. Fantasma de si mesmo aflige-se sem amor e sem amar.

Ita Portugal