domingo, 2 de agosto de 2015

Exercício


Pego num pedaço de silêncio. Parto-o ao meio,
e vejo saírem de dentro dele as palavras que 
ficaram por dizer. Umas, meto-as num frasco
com o álcool da memória, para que se 
transformem num licor de remorso; outras,
guardo-as na cabeça para as dizer, um dia,
a quem me perguntou o que significavam.
Mas o silêncio de onde as palavras saíram
volta a espalhar-se sobre elas. Bebo o licor
do remorso; e tiro da cabeça as outras palavras
que lá ficaram, até o ruído desaparecer, e só 
o silêncio ficar, inteiro, sem nada por dentro.

Nuno Júdice